Vice-presidente nacional da OAB aponta precarização da Justiça e prejuízo à cidadania
Mineiro, duas vezes presidente da OAB-MG, o vice-presidente nacional da OAB, Luís Cláudio da Silva Chaves, foi o responsável pela abertura do segundo dia da IV Conferência Estadual da Advocacia, realizada na sede da OAB em Palmas, de 25 a 27 de outubro. Durante sua fala institucional, Chaves detalhou o que considera a precarização da Justiça e como ela traz prejuízo à sociedade brasileira. O vice-presidente abriu os trabalhos de uma manhã que teve palestras do secretário-geral-adjunto da OAB Nacional, Ibaneis Rocha, e do conselheiro federal e advogado consagrado Carlos Roberto Siqueira Castro. Depois, os três, junto com a vice-presidente da OAB-TO, Lucélia Sabino, e com o conselheiro federal Pedro Biazotto, participaram de um debate sobre os temas abordados. Luís Chaves, que elogiou a diretoria da OAB-TO, composta de “um timaço de abnegados advogados e advogadas”, começou sua fala com uma provocação em forma de questionamento: “Qual é a justiça que queremos?” Para ele, o momento da advocacia é “muito ruim”, principalmente por causa do Judiciário que não assume o protagonismo previsto na Constituição. “De 1988 para cá, temos leis maravilhosas, mas não há efetivação do direito. O estado não dá saúde, porque não tem dinheiro, não dá educação, porque não tem dinheiro e não dá acesso pleno a Justiça, porque não tem dinheiro”, criticou Luís Chaves ao salientar que os próprios representantes do Judiciário se contentam em não fazer o seu papel para economizar. “Como vamos admitir no Brasil um juizado especial, que dispensa o advogado em causas de até 20 salários mínimos? Aí eu digo que eles fazem o juizado especial não para melhorar resolução do processo, mas apenas para economizar. O mesmo está ocorrendo com o juizado da família”, ressaltou. Para ele, a advocacia tem de seguir unida para não permitir o aprofundamento da precarização da justiça como os tribunais querem. “Eles querem diminuir os recursos por causa de meta. Dizem que a mediação e a conciliação são boas para desafogar o judiciário e não para qualificá-lo. Política econômica e não estrutural, de melhorias do Poder”, lamentou Luís Chaves. O vice-presidente da ordem salientou que o advogado não tem medo de desagradar às autoridades. “O juiz não gosta do advogado combatente. Mas, depois, o juiz será parte de um processo, e aí com certeza ele vai buscar o advogado mais combatente para fazer a sua defesa”, destacou. Debates Nos debates, Luís Chaves foi perguntando sobre a conveniência, ou não, de uma Constituinte exclusiva agora ou de alterações profundas na Carta da República. Para ele, a grande alteração que o país precisa é a Reforma Política. “Mas esse Congresso é apto para isso? Qualquer alteração legislativa no momento, ela será feita por um congresso contaminado por denúncias e sem legitimidade representativa. Essas mudanças serão apenas para melhorar a chance deles se reelegerem e não um avanço para a democracia”, frisou. Ele lembrou que a Ordem já contribuiu com uma proposta de Reforma Política e pediu para que as pessoas, em 2018, valorizem o voto. “Voto em branco e voto nulo não são soluções para os nossos problemas. Não participar da eleição não é a solução para os nossos problemas”, destacou Luís Chaves. O vice-presidente criticou, ainda, a autorização de cursos tecnológicos em serviços jurídicos. Para ele, esse curso é mais uma peça da “caixinha de maldades do poder público contra a cidadania e contra a advocacia”. Ibaneis Intitulada “Ética e Prerrogativa”, a palestra de Ibaneis Rocha começou com um resgaste histórico da importância da ética e das aulas de ética na profissão. “Antes mesmo da formação da Ordem já se discutia ética e disciplina. Não mercantilização, não publicização, respeito aos colegas, magistrados e ao MP”, destacou. Para ele, a ética é um preceito fundamental da profissão. Ibaneis defendeu, com ênfase, as normas do Código de Ética da Advocacia que proíbem publicidade. “Eu nunca precisei fazer propaganda e sei que vários cresceram na carreira sem precisar”, ressaltou. Em relação às prerrogativas, Ibaneis destacou o trabalho que ele ajudou a fazer na gestão de Estefânia Viveiros, quando ela presidiu a OAB-DF. Logo, ele foi chamado para também colaborar com o sistema nacional de prerrogativas na administração de Cézar Britto. “Começamos a combater esse estado policialesco e tivemos dez anos de muito sucesso”, ressaltou. Citou e detalhou várias conquistas da advocacia, como a lei contra interceptação telefônica de advogados e advogadas, lei contra o uso abusivo de algemas, e obrigatoriedade da presença de um representante da OAB para prisões em flagrante. “Tivemos um período de tranquilidade durante dez anos. Agora vivemos o pior. Estamos vivendo o estado da opressão judicial. A pior ditadura é do Judiciário, porque não temos a quem recorrer”, destacou Ibaneis, ao falar dos tempos atuais repletos de violações sucessivas as prerrogativas advocatícias. Ibaneis destacou estar muito preocupado com o que a categoria está passando. “Em todos os países do mundo quando se aumenta os poderes da acusação, se busca equiparar a força da defesa. Mas aqui dizem que estamos querendo direitos a criminosos”, explicou. O secretário-geral-adjunto ainda ressaltou que a Ordem e advocacia sempre defenderam o combate a corrupção. “A magistratura e o MP se aliam a causa do momento. Nós não. Trabalhamos pela Lei Ficha Limpa, trabalhamos contra impunidade e contra compra de voto”, ressaltou. Ele fez um paralelo da operação Lava Jato com o Mensalão. Segundo Ibaneis, no Mensalão todos os responsáveis tiveram direito ao devido processo legal, foram punidos e presos após o fim da tramitação, com a sociedade ficando satisfeita. Agora, na Lava Jato, o aprisionamento preventivo é a forma de combater a corrupção, violando a presunção da inocência e às prerrogativas da advocacia. “Não se combate ilegalidade com outra ilegalidade”, finalizou. Siqueira Castro Advogado com escritórios em 22 estados do Brasil, Siqueira Castro disse que o Brasil vive uma disfuncionalidade, citando o Judiciário como referência. O advogado ressaltou que o juiz, no país, estuda para não prestar jurisdição e se alegra muitas vezes por não ter que julgar. “É como o soldado, se prepara para aquilo que não quer, que é ir à guerra. São muitas súmulas, muitos mecanismos para evitar admissibilidade de ações. Há um impasse psicanalítico”, ressaltou, ao dizer que, diferentemente dos magistrados, a advocacia que quer muitas causas, muito trabalho, embates e discussões. Ele também criticou a situação geral no Brasil, que tem mais de um terço dos seus congressistas denunciados e a quarta maior população carcerária do mundo, com a maioria sendo negros miseráveis. “É uma pornografia governamental. João Mangabeira dizia que entre as elites e o povo, o povo é muito melhor. Ele tinha razão. A promiscuidade da elite política e empresarial é algo nunca visto”, frisou, ao dizer que isso é mais um sintoma do quadro de disfunção do aparelho do Estado. Siqueira Castro também contou experiências pessoais profissionais, como a contribuição dele para a Constituição de 1988 e um pouco dos diálogos com o então presidente da Câmara, Ulisses Guimarães. Além disso, ressaltou o papel da Ordem no combate à Ditadura Militar. “A Ordem tem colaborado de forma muito construtiva com o Congresso Nacional e com a sociedade. A Lei da Ficha Limpa e é um exemplo. Os pedidos de impeachment de Collor, Dilma e de Temer. A nossa entidade ultrapassa suas finalidades corporativas. Papel social da Ordem é incontestável”, frisou.