Com Mendes e 2 ministros do STJ, Ohofugi preside debate sobre processo constitucional
São Paulo (SP) – Debates sobre Processo Constitucional guiaram o Painel 4 da XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira. Realizado na tarde desta segunda-feira, 27 de novembro, o encontro reuniu nomes importantes do meio jurídico e abordou temas como crise política, jurisprudência e neoconstitucionalismo. Mais de mil pessoas prestigiaram os participantes do painel, presidido por Walter Ohofugi, presidente da OAB-TO (Ordem dos Advogados do Brasil no Tocantins), que durante a abertura ressaltou a importância do debate tendo em vista a “crise sem precedente no país”, apontada por ele como “uma crise institucional e moral”. Ohofugi ressaltou, também, a importância do direito de defesa, fundamental para a democracia. A mesa reuniu nomes importantes do meio jurídico nacional, com os ministros Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), Herman Benjamin e Sebastião Reis, ambos do STJ (Superior Tribunal de Justiça). O painel teve como relatora Gisele Fleury Charmillot Germano de Lemos e, como secretário, Solano Donato Carnot Damacena, conselheiro federal da OAB pelo Tocantins. Completaram a mesa os conselheiros federais da OAB Flávio Pansieri e Thiago Rodrigues de Pontes Bomfim; os advogados Ana Paula Oliveira Ávila e Arnoldo Wald; e a professora Cláudia Schwerz Cahali (PUC-SP). O ministro Gilmar Mendes abriu a discussão destacando a Constituição Federal de 1988 como a “mais longeva” da história republicana brasileira, iniciada em 1889. “É preciso ter espírito aberto para, quando criticarmos a Constituição, reconhecer a sua importância”, afirmou. Mendes disse que a Carta Magna opera bem mesmo após o impeachment de dois presidentes da República: Fernando Collor de Mello (1992) e Dilma Rousseff (2016). “A Constituição de 1988, mal falada e mal compreendida, é, ironicamente, a Constituição mais longeva e a que deu maior estabilidade institucional. Ela vem sendo testada em momentos muito difíceis, como graves crises institucionais e dois impeachments, mas nos trouxe um dado de normalidade”, disse. Mendes destacou o importante papel do Supremo ao regular temas constitucionais que dificilmente seriam tratados pelo Congresso Nacional, como o aborto de feto anencéfalo e a união homoafetiva. No entanto, o ministro, que também preside o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), considerou uma “tragédia” a recusa do STF em impor uma cláusula de barreira aos partidos políticos. Para ele, a medida teria contribuído para evitar o número excessivo de partidos. O Brasil tem hoje 35 legendas legalizadas, sendo 28 delas representadas no Congresso. “Isso porque fomos muito criteriosos e rigorosos ao liberar os registros, senão teríamos cerca de 50 siglas”, frisou. Crise partidária O ministro Herman Benjamin falou sobre a “crise profunda dos partidos”, mas destacou que “sem os quais não há democracia”. Ele criticou, porém, o comando fixo de legendas e a manutenção desse quadro pela reforma política aprovada neste ano pelo Congresso “O Congresso disse que os partidos podem continuar com donos, como se fossem capitanias hereditárias. Alguns deles são capitanias hereditárias. Basta olhar a composição, sobretudo quem é o presidente e o tesoureiro, onde há vínculo familiar”, afirmou o ministro do STJ. A situação de partidos com donos também se repete no Tocantins e já foi alvo de críticas do presidente Walter Ohofugi. Para ele, é necessário acabar com as comissões provisórias partidárias e implantar a democracia nas siglas, com eleições diretas para seus dirigentes. Por sua vez, Benjamin avaliou que, apesar de as garantias previstas na Constituição seguirem relevantes, as instituições vivem um momento de instabilidade pela turbulência política. “Hoje, vivemos num país em que as próprias instituições estão em vulnerabilidade”, disse. O ministro afirmou que “o curso da república brasileira está ameaçado por essa vulnerabilidade, que já não é mais das pessoas, é institucional”. De acordo com Benjamin, é importante melhorar o mecanismo de elaboração e apresentação de ações civis públicas ante o cenário no qual o Poder Judiciário não tem “mecanismo de defesa para a compra de Medida Provisória, de compra de lei” no âmbito do Legislativo --como revelado pela Operação Lava Jato. Excesso de processos Já o ministro Sérgio Reis chamou atenção para o excesso de ações nos tribunais brasileiros. Ele apresentou diversos números, entre eles o de que cada ministro do STJ julgou 648 habeas corpus somente no mês de outubro. Reis defendeu que os entes do Judiciário e da Advocacia sentem para dirimir gargalos e estimular a adoção de decisões precedentes de tribunais superiores por cortes de tribunais inferiores. “Não adianta mais o juiz de um tribunal ficar aplicando aquilo que ele acha o mais correto. Temos uma hierarquia e é preciso segui-la”, defendeu. O ministro criticou magistrados que, segundo ele, insistem “nisso de cada um ter a sua lei, a sua interpretação da lei”. “Isso não é bom para a magistratura, não é bom para a Justiça”, disse. O advogado Arnoldo Wald defendeu a participação do advogado na articulação sugerida pelo ministro Sebastião Reis. Segundo ele, cabe ao advogado “apresentar aos juízes os fatos para os quais ele não tem tempo para fazer a reflexão”. Wald, que integra um dos escritórios de advocacia mais antigos em atuação no Brasil, defendeu a categoria com um discurso bastante aplaudido no final da apresentação. “Jamais os advogados foram tão importantes como nesse momento da vida brasileira. Ele é o defensor das instituições [diante] da vulnerabilidade”, disse, fazendo referência ao ministro Herman Benjamin. Em linha com a apresentação do ministro Reis, a professora Cláudia Schwerz Cahali criticou a cultura do litígio e da transferência de resoluções para “terceiros”, com a qual o brasileiro se habituou. “Temos uma cultura da sentença. Temas importantes como mediação e arbitragem não são matérias obrigatórias da grade curricular dos cursos de direito”, afirmou. Ela defendeu a arbitragem e outros mecanismos de mediação como necessários para reduzir a judicialização nociva existente no país. “O conflito é da natureza humana, mas há casos em que o advogado pode contribuir”, disse. Neoconstitucionalismo O conselheiro federal da OAB Flávio Pansieri ressaltou a “grande revolução constitucional em 1988”, que, segundo ele, “não foi a possibilidade de escolhermos o presidente da República, mas o enclausuramento do direito normativo do Estado.” Ele criticou movimentos que tentam sugerir um “neoconstitucionalismo” e avalia que teorias nesse sentido “fundam-se em valores que podem estar fora do direito”, ameaçando o Direito Constitucional. Pansieri também foi palestrante na IV Conferência Estadual da Advocacia do Tocantins, realizada de 25 a 27 de outubro, em Palmas. Na mesma linha de Pansieri, o conselheiro federal e ex-presidente da Seccional da OAB em Alagoas, Thiago Rodrigues de Pontes Bomfim, destacou a importância de se interpretar os “os dispositivos [constitucionais] de acordo com os princípios com os quais foram criados”. A advogada Ana Paula Oliveira Ávila, integrante do Conselho Superior de Advocacia da OAB do Rio Grande do Sul, alertou para o risco de se tentar validar provas obtidas de forma ilegal sob o argumento de atender ao “interesse público”. Mudar a norma restringiria direitos do cidadão e o colocaria sob o risco de se validar a tortura como prática de obtenção de confissão. “Essa é uma norma que não deixa dúvida na forma como está prevista. Se ilícita, a prova não pode ser admitida no processo”, disse Ana. (Com informações da OAB Nacional e Daniel Machado)