Raymundo Faoro e Waldir Troncoso Peres são homenageados
São Paulo - A cerimônia de encerramento da XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira foi marcada pela homenagem a dois expoentes do mundo jurídico. O Patrono Nacional foi Raymundo Faoro, presidente do Conselho Federal da OAB entre 1977 e 1979. O criminalista Waldir Troncoso Peres, conhecido como Príncipe dos Advogados, foi escolhido pela seccional paulista como Patrono Local do evento realizado entre 27 e 30 de novembro no Pavilhão de Exposições do Anhembi, em São Paulo. Da trajetória de Faoro se exaltou o papel central no processo de reabertura política do país. O jurista, historiador e cientista político gaúcho presidiu a OAB justamente durante o processo de negociação da Lei da Anistia, passo fundamental para a retomada da democracia no país. Depoimentos compilados em um vídeo exibido durante a cerimônia mostram a relevância que Faoro, falecido em 2003, teve na negociação com o então presidente Ernesto Geisel. O próprio advogado contou que foi durante a VII Conferência Nacional, em Curitiba, em 1978, que soube da disposição do general em negociar a retomada das liberdades políticas. O diálogo se iniciou logo em seguida. “Ele estava disposto a fazer a abertura. Foi nessa ocasião também que me mostrou o esboço da revogação dos atos institucionais.” O advogado Roberto Rosas destacou que, naquele momento, um diálogo institucional entre o presidente da OAB e o líder do regime era uma barreira grande a ser rompida, e Faoro teve a coragem necessária para seguir em frente. Gisálio Cerqueira Filho, professor titular de Teoria Política da Universidade Federal Fluminense, acrescentou que o então presidente da OAB soube fazê-lo de “forma firme e contundente”. “Ele se destaca como intelectual e liderança que articula a questão política com a questão jurídica.” Em material de arquivo, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Evandro Lins e Silva enalteceu a condição imposta por Faoro para negociar a anistia: a retomada do habeas corpus, que havia sido suprimido durante a ditadura, artifício para facilitar a violação de direitos humanos. “Ele foi quem acabou com a tortura no Brasil e poucos sabem”, disse Lins e Silva. Modesto da Silveira, advogado de presos políticos, disse que esse foi o sinal cobrado pelo presidente da OAB para saber das reais intenções dos militares em garantir a volta da democracia. “Tivemos o presidente certo na hora certa.” Patrono Local Waldir Troncoso Peres, advogado criminalista falecido em 2009, aos 85 anos, foi homenageado como Patrono Local. Com uma trajetória de mais de mil júris ao longo da carreira, iniciada aos 20 anos no interior paulista, ele é reconhecido como um dos grandes nomes da área. “Ser advogado criminal para mim era uma compulsão. Eu me sentia seduzido por ela. Eu nunca tive dúvida vocacional”, disse Peres, em vídeo exibido durante a cerimônia. “Todos os homens têm o direito de defesa. Essa abrangência é absoluta, é total, e não tem nenhuma exceção.” Nomeado em 1950 como advogado interino do Departamento Jurídico do Estado e aprovado para a função em concurso público em 1954, ele teve a trajetória enaltecida por Marcos da Costa, presidente da OAB São Paulo. “Liberdade. Era essa a palavra que conduzia sua vida.” Luiz Flávio Borges D'Urso, ex-presidente da seccional e Conselheiro Federal da OAB, acrescentou: “Foi e é o meu ídolo. O maior orador de todos os tempos.” No púlpito, o criminalista Antonio Cláudio Mariz de Oliveira destacou a influência exercida por Waldir Peres sobre os profissionais da área. “Waldir Troncoso, para nós advogados de São Paulo, para os advogados criminais do Brasil, sempre foi uma referência. Eu diria que para mim a impressão é que Waldir era meu conhecido antes mesmo de 1945, antes mesmo que nasci. Waldir paira acima do tempo. Ele é atemporal. Ele transcende o tempo. Waldir não tem um porto, não tem uma pousada geográfica. Waldir é algo que simboliza a advocacia criminal e, portanto, transcende o tempo e o local”, disse. Ele destacou o profundo interesse do Patrono Local pela compreensão do pensamento do ser humano. “Não é sem outra razão que no júri partia para a linha psicológica da defesa. Para procurar entender os motivos do crime. E aí o seu sucesso”, disse. “Nós não somos juízes. Nós estamos para a defesa possível daquele que está sendo julgado, sem maniqueísmo, com tolerância. E Waldir só era intolerante com um aspecto: era intolerante com a ameaça de violação à liberdade. Aí não admitia meio-termo. Era só um lado da moeda a liberdade.”