OAB se mobiliza contra aprovação da PEC dos Precatórios
Estima-se que Estados e municípios devem R$ 100 bilhões em precatórios - dívidas já reconhecidas pela Justiça, mas pendentes de pagamento. O que fazer para quitar ao menos parte desse débito que se tornou impagável vem colocando parlamentares e advogados em rota de colisão. Os primeiros devem aprovar, em segundo turno na Câmara dos Deputados, a chamada PEC dos Precatórios, que cria novas regras para o pagamento das dívidas. De acordo com a proposta, Estados e municípios terão de destinar até 2% de suas receitas líquidas anuais para pagar precatórios. Metade do valor será destinada para pagar as dívidas por ordem cronológica e à vista. O restante do dinheiro poderá ser usado em câmaras de conciliação e leilões. Ou seja, permitirá a governadores e prefeitos negociar as dívidas e pagar àqueles que aceitarem receber os menores valores por seus papéis. A Ordem dos Advogados do Brasil classifica a proposta como o "maior calote institucional da história do País". Não é à toa que a apelidou de PEC do Calote. "A proposta transforma em moeda podre as decisões da Justiça ao permitir leilão de precatórios para pagamento pelo menor preço. É uma ofensa direta às decisões dos juízes, nas quais foi fixado o valor correto que deve ser pago ao contribuinte", afirma Cezar Britto, presidente da OAB. Britto está mobilizando advogados de todo o país para tentar barrar a aprovação. Para o relator da PEC, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a posição da OAB é equivocada. Ele acredita que, apesar da resistência dos advogados, a proposta será aprovada. "Hoje, na prática, os credores não recebem seus precatórios. A proposta melhora, e muito, o quadro atual", diz o deputado. Eduardo Cunha defende que a solução encontrada atende ao interesse de quem tem precatórios vencidos há tempos. Já o presidente da Comissão de Precatórios da OAB, Flávio Brando, considera absurda a defesa da proposta feita pelo parlamentar. "Seria como se um cidadão gastasse muito mais do que pode pagar por muitos anos e, depois, decidisse usar só 2% de seu salário para arcar com as dívidas", afirma. Atualmente, a regra é a de que os precatórios sejam pagos sempre por ordem cronológica. Na prática, contudo, muitos estados e municípios não arcam com as dívidas. "O governo de São Paulo deve, hoje, R$ 20 bilhões. A prefeitura paulistana, quase R$ 15 bilhões", aponta Brando. O advogado admite que a solução para o problema é bastante complicada. "A dívida se tornou insuportável por qualquer ângulo que se examine". Mas ele defende a adoção de outras soluções para o problema. Flávio Brando afirma que o governo federal poderia entrar em campo e trocar os precatórios por Notas do Tesouro Nacional com vencimento em até 30 anos. Assim, os credores poderiam negociar os papéis no mercado com deságio de 20% ou 30%, no máximo. Tecnicamente, a sugestão do advogado é irrepreensível. No entanto, poderia passar ao mercado a mensagem de que o governo federal está driblando a Lei de Responsabilidade Fiscal para assumir, mais uma vez, a dívida de estados e municípios. Por isso, não é encampada. "Se for aprovada a proposta, estados e municípios conseguirão comprar os precatórios com deságios de até 80%, em um leilão às avessas perverso", afirma Brando. Ele diz que o raciocínio atual de governadores e prefeitos é o de que, se os papéis são vendidos no mercado por 25% de seu valor, é este o preço que a administração pública deve pagar por eles. A PEC dos Precatórios foi apresentada pelo senador Renan Calheiros (PMDB-AL), mas sua criação é atribuída ao atual ministro da Defesa, Nelson Jobim. Depois de aprovada em segundo turno pela Câmara, a proposta volta à análise do Senado. Por se tratar de emenda à Constituição, ela é promulgada pelo Congresso e não depende de sanção do presidente da República. (A matéria é de autoria do repórter Rodrigo Haidar,do IG Brasília)